quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Drummond

"Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial.
Industrializou a esperança fazendo-a funcionar no limite da exaustão.
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para adiante vai ser diferente."

(Carlos Drummond de Andrade)

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Como seria o mundo sem você?


Embora não seja muito conhecido aqui no Brasil, há um clássico hollywoodiano que é repetido à exaustão nos EUA nesta época de Natal. O nome do filme é "A felicidade não se compra" (1946) do grande diretor Frank Capra. Mesmo para os que não gostam de filmes tão velhinhos, eu dou a dica: vale a pena. Frank Capra dirigia para as massas; foi o diretor-símbolo de uma época muito triste e difícil para os americanos (a chamada Grande Depressão, pós crise de 1929). Suas estórias sempre trazem uma mensagem de otimismo e esperança, mesmo quando as coisas não estão tão bem. "A felicidade não se compra" ("It's a wonderful life)" é estrelado por James Stewart ( o Tom Hanks da época), um cara comum, que em nada lembrava os grandes galãs da era dourada. Ele é George Baileys, um pai de família que está enrolado com alguns problemas e pensa em suicidar-se no dia do Natal. Um anjo então é enviado a Terra para refletir junto com ele se esta é a melhor forma de resolver os problemas. Ele relembra com George vários momentos de sua vida e o estimula a pensar como seria a sua pequena cidade se ele nunca tivesse existido. George consegue perceber o quanto ele foi importante, sem se dar conta. É uma boa reflexão.

Aliás, você já pensou sobre isso? Como seria o mundo se você não tivesse nascido? Em tempos como os nossos, em que tudo se torna tão efêmero e esquecível, e que não temos sequer um momento para elaborar nossos lutos, é algo para se pensar...
* publicado originalmente no meu antigo blog (endereço ao lado)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Vida de tiete


E fui ver a Madonna. Sem ser fã, nem nada. Ingresso dado não se olha os dentes e lá fui eu. De volta ao Morumbi depois de alguns anos.

Quando começou a ameaçar chover, me lembrei de meu primeiro show naquele mesmo estádio. Menudo, em Março de 1985. Pirralha, nem quis saber de Rock in Rio em Janeiro, queria mesmo era ver o Robby e cia. Ver mesmo eu não vi nada, mas fã que é fã, só de respirar o ar do ídolo tem o dia mais feliz de sua vida. Para mim foi, na época. Morrendo de medo que o show fosse cancelado por conta da chuva e ainda mais com medo de ser pisoteada pelas milhares de adolescentes enlouquecidas. Gritei e chorei. "Robbyyyyyyyyyyy, eu te amo!!!" Pois é, todo mundo tem um passado trash e o meu é.

Engraçado assistir a um show sem envolvimento emocional. Foi assim para mim ontem. Baladinha boa com uma loira que sabe fazer espetáculo. Eu lá dançando e neguinho chorando e se arrebentando na beirada do palco gritando "I love you Madonna". Deu um tiquinho de saudades do meu lado tiete. Tiete se contenta com tão pouco e esse pouco traz uma felicidade transcendental. Não precisa de namorado, balada, nada. Tudo o que importa é o próximo cd, o próximo show, a próxima entrevista chegar. Tão simples a incompletude da vida se resolver desta forma, não?

domingo, 14 de dezembro de 2008

Bentinho e o Dick Vigarista


Diogo Mainardi, colunista da Veja, por vezes me parece um adolescente querendo aceitação através da polêmica. No entanto, não posso deixar de concordar com ele em sua coluna de hoje:


"A série Capitu tem um aspecto circense. É Machado de Assis encenado por Orlando Orfei. É Bentinho imitando Arrelia no picadeiro de Fausto Silva: "Como vai, como vai, vai, vai? Eu vou bem, muito bem, bem, bem". Luiz Fernando Carvalho usa uma linguagem grotesca, afetada, espalhafatosa, cheia de contorcionismos e de malabarismos. Machado de Assis é o oposto. No livro Dom Casmurro, o relato de Bentinho é espantosamente seco e desencantado. Ele narra sua história apenas para combater o tédio: sem drama, sem sentimentalismo, sem teatralidade. Quando Bentinho descobre que o filho bastardo de Capitu com Escobar morreu de febre tifóide, ele comenta simplesmente: ´Apesar de tudo, jantei bem e fui ao teatro`".


Taí o verdadeiro problema das adaptações para a telinha (ou telona) de obras máximas da literatura. É sempre uma leitura do diretor que pode ser boa, mas não era a sua. E a sua é sempre melhor. Assim com o Bentinho de Diogo Mainardi, o da minha imaginação, com certeza, não se assemelhava em nada com o Dick Vigarista.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Enquanto isso, no orkut...

Sorte do dia:

"A pessoa que lê sua sorte está de férias. Não sabemos o que dizer... Visite o perfil de alguém."

Medo.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Vicky Cristina Barcelona

Um filme de Woody Allen que não parece filme de Woody Allen. Quer dizer, sei lá se Woody Allen ainda tem um estilo marcante. Afinal, "Match Point" também não parece filme dele. As musas escolhidas perpetuam por um certo tempo e a da vez, ao que parece, é Scarlett Johannson. Até Nova Iorque perdeu seu lugar cativo e já deu lugar a Londres e, agora, Barcelona.

Entre as mulheres do filme, com certeza você se identificará com uma delas, ou com uma das relações amorosas, segundo Contardo Calligaris. Vicky, Cristina, Maria Helena ou Judy, qual você é? É qual das relações você deseja para si? Cristina-Juan Antonio? Maria Helena e Juan Antonio? Cristina-Juan Antonio e Maria Helena? Vicky e Juan Antonio? Vicky e Doug? Para quem você se viu torcendo no final da história?

A louca Maria Helena de Penélope Cruz disse uma frase sábia e muito verdadeira. Disse ela, no que foi repetida por Juan: "a história de amor mais romântica é aquela que ficou inacabada". E não é ?

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Augusto César e Marty McFly

Augusto César acreditava que Rosana, sua mulher, era uma santa. Esposa devotada, teria sido sequestrada por E.T.s e nunca devolvida. Nenhuma outra estava à altura dela para Augusto e ele ansiou por anos a sua volta. Ao saber que Rosana, na verdade, era uma esposa adúltera e que não havia sido abudzida coisa nenhuma, Augusto teve de encarar o fato que fora abandonado. O que fazer agora com a ficção que criou para explicar a própria dor? Quem era de fato, ele Augusto? Não era mais uma vítima dos E.Ts, nem sua mulher fora escolhida entre tantas para experiências inter-galácticas, dolorosa história que o mantinha como alguém especial. Agora, o que era além de um corno e lunático?

Na década de oitenta, um clássico brincou com a possibilidade da viagem no tempo. Em "De volta para o futuro"(1985), Marty McFly volta ao passado. Ao se encontrar com os pais e envolver-se amorosamente com sua mãe, ele colocou em risco sua própria vida, mas teve um final feliz.

Na vida real, sem máquinas do tempo, somos um pouco como Augusto César, personagem de "A favorita". Temos nossa leitura dos fatos que nunca correspondem à realidade, afinal não temos acesso ao real. Às vezes precisamos acreditar que fomos vítimas, quando, na verdade, fomos covardes. Precisamos acreditar que alguém nos deixou porque nosso amor era especial demais para ser vivido, e não porque ele, de fato, amava outra pessoa. Precisamos acreditar na santidade de nossa mãe, na crueldade ou heroísmo do pai, que fomos os filhos preferidos, ou que não, fomos os rejeitados, tal como muitos heróis sofridos de folhetim.

Às vezes, necessitamos de uma ficção pela vida inteira, ainda que seja totalmente fantasiosa, para nos manter psiquicamente vivos. Outras, reconstruindo nossa história com outro sentido (em uma psicanálise, talvez) podemos ter um futuro diferente. Talvez até melhor, como foi com Marty McFly, ao voltar de sua viagem às origens.