segunda-feira, 30 de maio de 2011

Um tapa na cara da sociedade!

Uma das cenas mais marcantes do cinema é a de Scarlett O´Hara arrancando um rabanete(!) da terra e jurando não mais passar fome novamente.

Ainda que jure por Deus, ela acrescenta que poderia roubar, matar e caluniar para que isto não acontecesse mais. A cena em que ela toma emprestada a cortina verde para fazer um lindo vestido marca o início da reviravolta de Scarlett na trama. Alguns dizem que "E o vento levou" é das histórias de amor mais lindas do cinema. Não é.  O filme é a história de uma mulher linda, forte e egoísta. Scarlett não amava nem Ashley e nem Rett Butler. Scarlett só amava a si mesma e sua terra: Tara.
Lembrei de Scarlett ao assistir a nova história de Norma (Glória Pires) em "Insensato Coração". A novela começou meio capenga mas, ao que parece, começa a reagir. Não há audiência que resista a uma história de vingança e recomeço, especialmente quando envolve humilhação. Embora o brasileiro seja, em sua maioria, criado na religião judaico-cristã, muito pouca gente gosta de oferecer a outra face. O tema da vingança (especialmente a feminina) tem lugar cativo na teledramaturgia nacional. E é legitimada, ainda que seja aos moldes de Scarlett: roubando, matando e caluniando.

Um dos clássicos do terror adaptados para o cinema foi "Carrie, a estranha" (1976). A paranormal Carrie (Sissy Spacek) era uma adolescente atormentada por uma mãe fanática religiosa e seus colegas da escola. Na festa de formatura, ela começa sua vingança. Silvio de Abreu fez sua versão de Carrie com Regina Duarte e seu banho de lixo em "Rainha da Sucata" (1990). A moça pobre se vinga mais tarde tornando-se milionária (a tal rainha do título) e casando-se com sua paixão adolescente que a teria humilhado tanto (Edu Figueroa, de Tony Ramos). Walcyr Carrasco escreveu sua Carrie: a doce Ana Francisca (Mariana Ximenes) de "Chocolate com Pimenta" (2003). Aguinaldo Silva, por sua vez, adaptou a já antológica Tieta (1989).

Ah, que sucesso faz o "tapa na cara da sociedade" ou, mais ainda, no algoz, geralmente um homem (seja o pai, o canalha, o playboy). Incrível como nessas colunas sentimentais apresentadas em vários portais observa-se imenso número de comentaristas que palpitam quando uma leitora sofredora abre seu coração. Se foi enganada e deixada, o conselho vem quase em uníssono: vingue-se, depois siga em frente.
Não, a vingança não é uma característica feminina. No entanto, mulheres ainda assistem muita novela e adoram uma reviravolta, especialmente quando envolvem um banho de loja. É bom ser Cinderela e Tieta de vez em quando, ainda que seja só na ficção. Isso desde Scarlett O´Hara e o vestido verde de cortina.

Scarlett e seu milagre de alta costura

domingo, 15 de maio de 2011

Vida louca, vida breve...

Eu não me lembrava que ele tinha morrido tão jovem. Lauro Corona tinha 32 anos quando faleceu, em 1989, em decorrência de AIDS. Isso foi há mais de vinte anos quando a homossexualidade e AIDS ainda eram temas tabus. Foi no mesmo ano em que a doença levou Cazuza.
Lembrei de Lauro Corona ao ler sobre ele na revista Joyce Pascowitch deste mês. A revista costuma relembrar ídolos de outros tempos. Esquecidos ou nem tanto.
Laurinho, como era conhecido, era presença onipresente na tevê. Era o equivalente, talvez, a um Cauã Reymond ou, pela semelhança física, um Bruno Gagliasso. Foi ídolo teen nos anos 7o e elogiadíssimo por seu talento nos anos 80. Além da pouca idade, chamou-me atenção o pouco tempo que ficou na mídia: 10 anos. A impressão que tinha, talvez por ser eu também muito novinha, era de que Lauro Corona esteve na tevê por muito tempo.
Morrer com AIDS naqueles tempos era algo muito triste. Era uma doença que não se falava o nome. Muitos artistas iam sumindo da mídia e, tempos depois, sabía-se da morte por causas misteriosas. Lauro Corona estava gravando uma novela das seis na época (Vida Nova) e, apesar de ser protagonista, teve de interromper sua participação. Já não tinha mais os cachos que o fizeram famoso e os olhos azuis pareciam muito distantes. A AIDS tinha uma cara. O olhar de quem tinha AIDS, aliado ao emagrecimento e, por vezes, ao efeito do AZT, era inconfundível. Lembro-me da sensação que tive ao assistir Lauro Corona em sua última novela. Eu senti que ele não faria mais nenhuma.
Pensando no ator, tive vontade de revê-lo cantar, junto de uma adolescente Glória Pires, o tema do casal em Dancin´Days. Segundo pessoas próximas, na época, eles eram tão amigos e viviam tão em sintonia que até respiravam no mesmo ritmo. É minha música preferida de Chico Buarque: João e Maria.