"Brasileiro não tem memória", dizem muitos. Eu concordo em partes quando converso com pessoas que nem sabem que houve uma ditadura no Brasil, ou que elogiam Fernando Collor e Sarney. Em contrapartida, sinto que nossos vizinhos chilenos e argentinos sofrem de reminescências. A impressão que tenho é que são povos mais melancólicos, passionais, saudosistas. Fazendo uma comparação grosseira, o ritmo símbolo do Brasil é o samba, enquanto que o da Argentina, por exemplo, é o trágico tango.Tudo isso para falar do filme mais emocionante que assisti nos últimos, sei lá, dez anos. "O segredo dos seus olhos" (2009), filme argentino que ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro merece, de fato, todas glórias que recebeu. Há uma melancolia cortante que percorre todo o filme, apesar de te fazer rir com gosto em muitos trechos.
Os dois personagens masculinos principais sofrem com suas lembranças, associadas às mulheres que amaram e com as quais não puderam vivenciar e concluir uma história. O pano de fundo é o cinzento ano de 1974, auge da ditadura argentina (e também brasileira). O filme trata de histórias dolorosamente interrompidas. Em suma, trata-se de um filme de amor, ainda que seja também um drama e um bom suspense. Riso e choro se alternam na sala de cinema.
Apesar da estrela do filme ser o ótimo Ricardo Darín (ator fetiche do diretor Juan Jose Campanella), a fragilidade impressa por Pablo Rago comove. Aliás, esta ator participou de outro grande filme argentino, ganhador do Oscar de 86, o belíssimo "A história oficial", também passado nos tempos da ditadura. É um legítimo filme "de cinema", para assistir no escuro, olhando para uma tela grande, sem pausas para recuperar o fôlego. Vale a pena.