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sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Mal traçadas linhas...

Eram os anos 90 e éramos em doze meninas. Em meu primeiro ano de faculdade eu morei em um "pensionato para moças" em Ribeirão Preto. Pouco conforto, uma cidade estranha, 17 anos, mas muita alegria e cumplicidade. Todas nós éramos "estrangeiras" naquela terra quente, abafada e linda. A Califórnia brasileira só carecia de uma boa praia e dos velhos amigos de infância, de quem sentíamos muita falta. Uma internet capenga só na Universidade e ainda não tínhamos o hábito dos e-mails.A hora mais esperada do dia? A visita do carteiro! Nada substitui hoje o prazer de receber aquelas cartas gordinhas, com envelopes preenchidos com letras conhecidas de gente querida (e, às vezes, MUITO querida).

Mulheres costumam escrever mais. Nem sempre enviam as cartas (hoje, e-mails), mas escrevem mais que os homens, no geral. A minha geração, que cresceu nos anos 80, é a geração dos papéis de carta e dos cursos (ainda) de datilografia. Até hoje digito sem olhar no teclado, "herança" do projeto de ser uma exímia datilógrafa. Nos cinzentos anos 80, já com medo do desemprego, eu pensava que se não fosse jornalista, pelo menos uma datilógrafa rápida eu teria condições de ser!

Papéis de carta! S2
Comecei a escrever cartas cedo. Para a turma da Mônica, para o Balão Mágico, para o Sonho Maluco do Gugu, para a promoção do Caldo Maggi da Galinha Azul. Hoje, nem jornalista, nem datilógrafa, sinto falta do prazer de escrever longas cartas, ainda que no teclado do computador. É raro conhecermos as letras das pessoas, no máximo, sua assinatura. Lembro de cartas longas e numeradas que escrevíamos durante a semana toda para então postar na sexta feira. Era mais fácil ser dramática com cartas. Letras tremidas, perfume nas páginas (com talco!), beijo de batom e até... lágrimas! Houve uma carta que deixei cair (de propósito) algumas lágrimas fazendo borrar toda a caligrafia. A mexicana que até hoje habita em minha pessoa usava e abusava do drama epistolar. Palavras como "arrebatamento" e "rompante" eram as minhas preferidas, além das metáforas básicas, é claro. Quantas vezes quase corri atrás do carteiro por conta de uma carta (mal) escrita e impulsiva? Minha "Thalia" interior, definitivamente, tinha de ficar em um calabouço.

Curso técnico  por correspondência: quer coisa mais velha?
Hoje não sinto mais aquela emoção ao ver o cara de uniforme amarelo dos Correios (sim, o carteiro era, ainda que indiretamente, um objeto de desejo!). No máximo, fico feliz ao receber uma encomenda ou aqueles livros que tanto quis comprar. Devo estar  ficando velha. O mundo pré-internet era mesmo um outro mundo. Um mundo que acabou. Saudades dele.


domingo, 4 de dezembro de 2011

Tudo o que eu queria te dizer...

"Nunca deixe para amanhã o que você pode fazer hoje". Esta máxima é recorrente contra os procrastinadores de plantão que somos todos, uns mais, outros menos. Em contrapartida, fala a favor dos impulsivos que telefonam (ou tuítam) bêbados de madrugada. Soninha Francine, que é colunista da revista Vida Simples, problematiza esta afirmação em sua coluna deste mês. Embora às vezes a espera possa ser fatal, adiar pode ser uma benção. A decisão, no entanto, de quando fazer uma coisa ou outra não é tão fácil assim. Palavra dita não volta atrás. Mas o tempo perdido também não.

Uma das coisas bacanas do (quase) finado orkut, eram as comunidades. Depois virou uma várzea, mas no início era um espaço interessante para trocar informações e conhecer pessoas. Uma das comunidades era uma que falava de escritos não enviados ("Escrevi, mas não mandei"). O pessoal relatava cartas ou e-mails escritos e não mandados; alguns pediam opinião e depois compartilhavam as repercussões. Quem aqui nunca apertou a tecla send e se arrependeu que atire a primeira pedra. Eu sou do tempo do correio e já cheguei a pensar em interpelar o carteiro para que a carta não chegasse. Em tempos de internet e sms, a coisa é muito mais fatal.


Martha Medeiros, outra das escritoras super citadas, escreveu um livro interessante sobre o tema. É um livro de cartas ("Tudo o que eu queria te dizer") e traz diversos tipos delas: de filha para mãe, de fã para ídolo, de amante ressentida, etc. Todas são fictícias, mas é fácil se identificar em ao menos uma delas.

O efeito de uma mensagem, ainda mais escrita, nunca é completamente previsível. Como se escreveu? Como será lida e em quais circunstâncias? Sophie Calle, uma escritora francesa, enviou a carta de rompimento de seu ex-namorado para 107 mulheres para que elas dissessem o que achavam e como a interpretavam. Das mais diversas opiniões, ela fez uma exposição de arte. Na FLIP de 2009, ela e o ex se encontraram pela primeira vez pós-carta em uma mesa para um confronto. Foi o máximo que vi de onde uma carta escrita poderia chegar. E de como palavras ditas de forma infeliz podem ter um eco absurdo.

Enfim, uma tática interessante (e conhecida) é mandar para si mesma o e-mail (carta, sms, whatever) e ler um dia depois. Escritos sob forte emoção podem soar ridículos e malucos para quem lê e não está na mesma vibe. Já escrevi um e-mail de madrugada que começou cordial, evoluiu para uma série de impropérios e terminou com um obrigada. Não ganhei tempo com ele, não me aliviou em nada e a palavra escrita foi e não voltou. Há coisas que devem ser ditas sim, aqui, agora e para o destinatário correto. Há aquelas que podem esperar. E outras tantas, bem... guarde-as ou jogue-as fora se não servirem mais.