segunda-feira, 14 de abril de 2014

O choro, os lenços e a feira livre

"Moça, o que acontece aí dentro desta casa que todo mundo sai chorando?"- perguntou-me o funcionário da padaria, enquanto eu tomava meu santo café espresso. A casa em questão era o novo consultório onde trabalho. Como é comum em consultórios de psicanalistas, não constam placas na casa. Aos olhos de quem passa pela rua, é apenas uma casa como tantas outras. No entanto, para o rapaz que me indagava com curiosidade, não era. Aparentemente, as pessoas entravam bem e saíam chorando de lá.Que tipo de tortura, afinal, se passava naquele lugar?

 Em um consultório de psicoterapia (ou psicanálise), uma caixa de lenços é ítem fundamental. As poltronas podem ser fuleiras, a sala pode não ser lá aquelas coisas, mas silêncio e uma caixa de lenços não podem faltar. Alguns clientes chegam a olhar desconfiados para a pobre caixinha: "As pessoas choram aqui?". Logo se acostumam. Um bom psicoterapeuta, aliás, tem de estar atento aos lenços que acabam. Que venham as lágrimas, mas que sejam acolhidas.



Mas porque catzo as pessoas choram em análise? Ora, um processo psicanalítico não costuma ser algo fácil. Há pessoas que choram porque dói. Ou porque estão em um espaço protegido. Ou porque estão na presença do analista e este choro é endereçado a ele. Há inúmeros sentidos possíveis para as lágrimas que caem, enfim.

Como psicólogos também passam por análise (em algum momento ou em vários momentos da vida), também eu precisei da santa caixinha de lenços dia desses. Se para o analista (psicoterapeuta), a caixa de lenços é um instrumento de trabalho, para o paciente (analisante), os óculos escuros são fundamentais. O choro pode vir quando você menos esperar. E se o seu analista for lacaniano e resolver interromper a sessão justamente na hora do choro, ferrou. E foi justamente isso que aconteceu. Tive de tentar me recompor em segundos antes de sair na rua, mas o nariz vermelho e os olhos inchados denunciavam o crime. Nenhum cisco faria aquele estrago todo, pensei. Dane-se, psicólogos também choram.  E saí, corajosa, para a rua. O que eu não contava era que o que me esperava do lado de fora era uma barulhenta feira livre.

Enquanto eu atravessava a feira (era o único caminho possível), ouvia gracejos e carinhosos consolos dos feirantes, que me ofereciam, desde frutas frescas a imensos pastéis. O resultado foi que cheguei ao final da feira alimentada e com a alma leve, sentindo-me amada e linda. Conclusões do dia: 1) Consultórios de psicologia podem ser, de fato, um mistério para quem vê de fora; 2) Feiras livres podem ser um alento no "pós-sessão", inclusive tendo efeitos terapêuticos e 3) Existe, sim, amor em São Paulo, a cidade que tem me acolhido tão bem.

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