Confesso que, na época, causou-me certo incômodo a mensagem final do longa. Don Juan, na verdade, era um paciente psicótico que, em seus delírios, era um aventureiro irresistível para as mulheres. A parceria deste paciente com seu psiquiatra (Brando) transforma a vida de ambos, especialmente a do médico. Ele, outrora distante da mulher, torna-se um homem mais romântico e menos rígido. Um roteiro bem americano e redondo, com um final feliz. Meu incômodo deu-se justamente por isso: pelo fato da loucura ter sido um tanto quanto romantizada e, de certa forma, confundida com ousadia, como em tantos outros filmes.
O filme sensação da temporada 2010-11 tem sido “O cisne negro”, um dos concorrentes ao Oscar deste ano. É outra abordagem da loucura. O espectador é levado a sentir, juntamente com a protagonista Nina (Natalie Portman) a perda gradual do contato com a realidade. O filme já começa com um jogo de espelhos: Nina e a mulher que se projeta nela (a mãe), Nina e a mulher que ela quer ser (Beth, a bailarina veterana) e Nina e a mulher que seria o seu lado negro (Lilly). Em sua transformação ao longo do filme, ela se vê nessas mulheres e em outras que cruzam seu caminho (no metrô, por exemplo). No universo do balé em que os limites do corpo são enfrentados diariamente, você é convidado a olhar o mundo através dos olhos de Nina (no que contribui, e muito, a movimentação da câmera). Sem exageros, você chega a sentir (especialmente dentro da sala de cinema) as dores físicas da personagem cujo corpo, real ou de forma alucinatória, se transforma. Como pano de fundo, a música cortante de Tchaikovisky.
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