segunda-feira, 2 de agosto de 2010

De outro mundo...

Há exatos 27 anos, meu pai saiu para um vôo e não voltou mais. Lembro da capa de uma revista Manchete (a revista preferida dele) que estava na sala durante aqueles dias tristes. Tinha o Michael Jackson na capa. Preto.

Penso que meu pai foi embora desta vida sem ver uma série de coisas. Não viu o crescimento da AIDS (aliás, ele nem sabia o que era a doença, provavelmente), não descobriu que Rock Hudson era gay, não acompanhou a queda do muro de Berlim pela tevê, não viu o Brasil ser tetra, penta. Não conheceu os Ronaldinhos, nem o Senna.Também não chegou a ver o movimento pelas Diretas-Já, a eleição de Tancredo, a posse do vice, o plano Cruzado, o Cruzado novo, o Collor vencendo o Lula, mas saindo mais cedo. Meu pai trouxe para nós um Atari importado quando ninguém tinha, e também um aparelho de fax. No entanto, não chegou a imaginar o que seria a internet e nunca, nunca teve um celular. No mundo das revistas Playboys do meu pai (e ele tinha muitas), não existia photoshop. Lá estavam as musas das pornochanchadas brasileiras e também estrelas de novela. Meu pai não chegou a ver o renascimento do cinema nacional. Naqueles anos, filme brasileiro era ruim.

Anos 70 e começo de 80 para mim são sinônimos de infância. Infância com meu pai. Depois disso, parece que passei para outra dimensão, entrei em outra etapa, outra história. Dia desses, minha mãe me olhou com cara de surpresa: "Filha, seu pai não chegou nem a ver o Movimento das Diretas". Ah, quantas coisas ele deixou de ver. Olhando assim, penso que ele viveu em outro mundo mesmo. Um mundo que acabou.

* texto originalmente publicado no meu antigo blog.

2 comentários:

Anônimo disse...

Let´s, Li apenas algumas postagens, mas adorei tudo o que li. Bjs, Pego.

Letícia disse...

Pego, querida, que surpresa boa!! Vc me chamava de bauzinho, lembra? Taí o meu baú...rs

Bjo, com muita saudade